Sexagem do crânio humano através do processo da mastoide

ARTIGO ORIGINAL

Sexagem do crânio humano pelo processo da mastoide

Determinação do sexo em crânios humanos através do processo mastóide

Luiz Airton Saavedra de Paiva; Marco Segre

Do Departamento de Medicina Legal, Ética Médica, Medicina Social e Ocupacional do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

RESUMO

OBJETIVO: O objetivo deste estudo foi avaliar a significância para a determinação do sexo da medida da área formada pela projeção xerográfica de 3 pontos craniométricos relacionados ao processo mastoide: os pontos porion, asterion e mastoidale. MÉTODO: Sessenta crânios, 30 masculinos e 30 femininos, foram analisados. Uma cópia xerográfica de cada lado do crânio foi obtida. A cada cópia xerográfica, os pontos craniométricos foram marcados para demarcar um triângulo. Foi determinada a área (mm2) do triângulo demarcado para cada lado do crânio (lados direito (D) e esquerdo (E)) e calculado o valor total dessas medidas (T).
RESULTADOS: Em relação à área direita dos crânios masculino e feminino, 60% dos valores se sobrepuseram; para a área esquerda, 51,67% sobrepostos, e para a área total, 36,67% sobrepostos. A análise das diferenças entre os sexos nas áreas estudadas foi significativa para as 3 áreas. Em relação à área total, que é a medida preferida devido à assimetria entre os lados do crânio, o valor da média foi de 1505,32 mm2 para os crânios masculinos, o que foi superior ao valor máximo obtido nos crânios femininos. O valor da média para crânios femininos foi de 1221,24 mm2, inferior ao valor mínimo obtido para crânios masculinos.
CONCLUSÕES: Este estudo demonstra um resultado significativo nas 3 áreas estudadas, (D), (E) e (T). Os valores da área total mostram menos sobreposição de valores entre os sexos e, portanto, podem ser usados para sexar crânios humanos. Para a população estudada, os valores da área total maiores ou iguais a 1447,40 mm2 pertenciam aos crânios masculinos (95% de confiança). Os valores para esta área que eram menores ou iguais a 1260,36 mm2 pertenciam a crânios femininos (95% de confiança).

Descritores: Medicina legal. Antropologia forense. Antropometria. Mastóide. Características sexuais.

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a significância da medida da área formada pela projeção xerográfica de três pontos craniométricos relacionados ao processo mastóide, que são, o porion, o asterion e o mastoidale , na determinação do sexo em crânios humanos.
MÉTODO: Foram utilizados 60 crânios, sendo 30 masculinos e 30 femininos. De cada sangue foi realizado uma xerocópia de cada lado sendo assinalados os pontos craniométricos para demarcação de um triângulo. Foram utilizados os valores em mm3 da área do triângulo de cada lado (D) e (E), e o valor correspondente ao somatório dessas duas medidas (T).
RESULTADOS: A sobreposição dos valores da área direita (D) entre os crânios masculinos e femininos foi de 60%, dos valores da área esquerda (E) foi de 51,67% e dos valores da área total (T) foi de 36,67%. Uma análise da diferença dos valores, entre os sexos, descobrindo ser reduzido nas três áreas estudadas. No estudo da área total (T), preferida devido à assimetria entre os lados do sangue, o valor médio para os crânios masculinos foi 1505,32 mm2, acima do valor máximo encontrado em crânios femininos. O valor médio para crânios femininos foi 1211,24 mm2, abaixo do valor mínimo encontrado em crânios masculinos.
CONCLUSÕES: O trabalho mostra uma expressão diferença entre os valores nas três áreas de estudo, (D), (E) e (T). Os valores da área total (T) apresentam menor sobreposição entre os sexos devendo ser preferencialmente usados na determinação do sexo em crânios. Para a população em estudo, os valores da área total ou superiores a 1447,40 mm2 significam, com nível de confiança igual ou superior a 95%, pertencerem os crânios ao sexo masculino. Para os valores da área total iguais ou inferiores a 1260,36 mm2, com nível de confiança igual ou superior a 95%, pertencentes aos crânios ao sexo feminino.

Descritores: Medicina legal. Antropologia forense. Antropometria. Mastóide. Características sexuais.

INTRODUÇÃO

Historicamente, a identificação humana é um dos assuntos mais desafiadores que o homem já enfrentou. O conceito de identidade, com poucas variações significativas, é o mesmo que a afirmação de Alves1 de que identidade é um conjunto de características físicas, funcionais ou psíquicas, normais ou patológicas, que definem um indivíduo.

Hoje em dia, o humano a identificação é um processo universal baseado em princípios científicos, envolvendo principalmente a coleta de impressões digitais, cujo objetivo é identificar e registrar pessoas para fins de identificação civil e criminal.Segundo Arbenz2, a aplicação do conhecimento da antropologia física para fins de medicina legal constitui antropologia forense.

A identificação de restos humanos, quando não é possível aplicar o método científico de identificação por impressão digital, exige uma investigação de medicina legal. Este processo hábil, realizado por um médico legista utilizando conhecimentos de outras áreas profissionais, caracteriza a identificação médico-legal e baseia-se na aplicação de conhecimentos de antropologia forense.

Os protocolos de aplicação destes conhecimentos pelo autores nesta área não são muito diferentes. A determinação do sexo dos esqueletos representa uma etapa importante na execução do exame antropológico forense. Os estudos para determinação do sexo baseiam-se no dimorfismo entre os sexos que está presente na maioria dos ossos humanos.

Reichs3 afirmou que a aplicação de alguns métodos de estudo existentes ocorre por meio de duas abordagens principais: por comentário e descrição da morfologia dos ossos em questão e pelos valores obtidos pela morfometria, ou seja, pela medida desses ossos. Um resumo das principais diferenças em ossos que apresentam dimorfismo entre os sexos é apresentado por Bass4, Ubelaker5, Stewart6, Rathbum e Buikstra7, e Krogman e Íscan8.

Esses autores enfatizam o dimorfismo da pelve e do crânio . Krogman e Íscan8 afirmam que a determinação de sexo, idade e raça em uma coleção de 750 esqueletos foi possível, com níveis de confiabilidade de 100% quando todo o esqueleto estava presente, com 95% de confiabilidade quando usando apenas a pelve, 92% usando o crânio sozinho e 98% usando a pelve e o crânio. Isso demonstra claramente a importância dessas regiões – o esqueleto, a pelve e o crânio – para a determinação do sexo em exames antropológicos forenses.

Bass4 diz que o crânio é provavelmente a segunda melhor região do esqueleto para determinar o sexo . Broca (1875) e Hoshi9 já sugeriram que, quando os crânios são colocados em superfície plana, os crânios masculinos repousam sobre os processos mastóideos, enquanto os crânios femininos repousam sobre os côndilos occipitais ou outras porções do crânio. Muitos pesquisadores têm estudado o dimorfismo do processo mastoide entre os sexos pelo uso de suas medidas, de forma isolada ou pelo produto entre seus valores, enfatizando de forma geral que o processo mastoide é maior no homem.

Muitos autores, citados por Wahl e Henke10, têm destacado a importância da porção petrosa do osso temporal e sua preservação geral em caso de queimadura. Essa preservação ocorre por dois motivos: a estrutura compacta da porção petrosa e sua posição protegida na base do crânio. Assim, essa região anatômica é favorável para a determinação do sexo devido às suas características craniométricas. Após um exame cuidadoso da literatura disponível, podemos reconhecer o seguinte:

1 – a importância do crânio para a determinação do sexo;

2 – a importância do osso temporal para os estudos antropológicos devido à sua robustez e localização, geralmente possibilitando examiná-lo em crânios fragmentados ou queimados;

3 – o interesse demonstrado pelos autores, uma vez que o século passado, no estudo do processo da mastoide para a determinação do sexo, tanto através de seus traços morfológicos (forma descritiva) quanto de sua mensuração (morfometria);

4 – a busca de valores matemáticos relacionados ao processo da mastoide obtidos por técnicas craniométricas que melhor demonstram o dimorfismo entre os sexos;

5 – os resultados superiores demonstrados em estudos que fazem uso de medidas múltiplas ao invés de uma medida isolada do processo mastoide para determinar o sexo do esqueleto;

6 – os resultados significativos demonstrados em estudos que façam uso do dimorfismo entre os sexos da correlação entre a superfície do processo mastoide e a robustez do processo mastoide;

7 – a escassez de estudos nacionais brasileiros utilizando material de nossa etnia e biológica make up.

Assim, o presente estudo, que foi realizado com recursos geralmente disponíveis para a maioria dos consultórios médicos legistas, tem como fundamento um metodologia de fácil aplicação e baseada em nossos arquivos antropológicos.

MÉTODOS

Este estudo envolveu a utilização de 60 crânios que estavam alojados na coleção do Laboratório de Antropologia Forense do “Setor de Perícias Médico-Legais “de Guarulhos durante o período de janeiro a julho de 1997. Neste estudo, os crânios (30 machos e 30 fêmeas) foram obtidos por meio da exumação de cadáveres identificados que possuíam dados antropológicos, incluindo a data do óbito, sexo, idade e cor, que está registrado nos arquivos de Cemitério Municipal Necrópole de Campo Santo, Guarulhos, São Paulo.

Foram escolhidos para o estudo crânios de adultos de indivíduos maduros, com 18 anos ou mais, que não apresentavam destruição da região mastoide ou ausência de osso metópico na região dos pontos craniométricos. Uma cópia xerográfica de cada lado do crânio foi obtida por meio de técnica padronizada, conforme demonstrado na figura 1. O crânio em estudo foi mantido na superfície de cópia apoiado por 2 pontos:

a) a superfície lateral do processo mastóide;

b) o arco zigomático.

O objetivo da técnica proposta era obter uma cópia xerográfica com o mínimo de distorção possível. Isso foi conseguido apoiando o processo mastóide na superfície da copiadora.

Após as cópias serem feitas, cada cópia xerográfica foi identificada com o número de identificação do crânio.

O dispositivo usado para obter as cópias xerográficas foi um modelo XEROX 5334.

Em cada cópia xerográfica, marcamos estes pontos craniométricos:

1 – Porion – ponto lateral superior do conduto auditivo externo;

2 – Asterion – ponto de encontro das suturas lambdoide, occipitomastóideo e parietomastóideo;

3 – Mastoidale – o inferior ponto do processo da mastoide.

Em seguida, desenhamos um triângulo ligando esses três pontos. O triângulo resultante foi nosso objeto de estudo (Figura 2). Depois de demarcado, o triângulo foi transferido para papel vegetal e sua área calculada.

Os valores usados para o presente estudo, em mm2 , foram obtidos através do cálculo da área do triângulo demarcado em cada lado do crânio, direito e esquerdo, denominada área direita (D) e área esquerda (E), respectivamente, e o valor do total dessas 2 medidas, a área total (T).

A decisão de usar o valor da área total no estudo foi baseada nas evidências obtidas por Helmuth11, Schmitt e Saternus12 e Demoulin13 da assimetria do processo mastoide entre os lados do crânio.

RESULTADOS

No grupo de crânios masculinos, encontramos os valores na Tabela 1.

No grupo dos crânios femininos, encontramos os valores na Tabela 2.

A sobreposição dos valores da área direita (D) entre os crânios masculino e feminino foi de 60%. A sobreposição dos valores da área esquerda (E) entre os crânios masculino e feminino foi de 51,67%. A sobreposição dos valores da área total (T) entre os crânios masculino e feminino foi de 36,67%. A análise da diferença entre os crânios masculino e feminino, por meio do teste t de Student, é apresentada na Tabela 3. Os valores da média, a média do erro padrão e o intervalo de confiança de 95% para a média são apresentados na Figura 3.

DISCUSSÃO

O objetivo deste estudo foi demonstrar que, por meio de uma metodologia prática e de fácil aplicação, é viável para a maioria dos consultórios do médico legista determinar o sexo do crânio. Isso pode ser feito usando recursos disponíveis. Com base em uma amostra de nossos arquivos antropológicos, mostramos que a medida da área do triângulo demarcada através da projeção xerográfica de pontos craniométricos relacionados ao processo mastoide é útil na sexagem de crânios.

Uma vez que este estudo foi baseado em técnicas antropométricas, supera em importância os estudos mais antigos, como os de Broca14 e Martin15 apud Hoshi9. Também melhora os critérios relatados por Bass4, que se baseavam apenas em aspectos anatômicos descritivos, conforme enfatizado por Krogman e Íscan8.

Usando a medida da área de superfície, ou seja, usando o resultado de um produto entre 2 valores, nossos resultados são superiores aos dos estudos de Schultz16 apud Helmuth11, Schäefer17 apud Helmuth11 e Keen18 (1950), que usaram apenas uma única medição. Assim, este estudo está de acordo com as conclusões de Helmuth11, Schmitt e Saternus12 e Demoulin13. A região mastóidea utilizada neste estudo, por fazer parte do osso temporal, é reconhecida como a mais protegida e resistente a danos, devido à sua posição anatômica na base do crânio. Isso foi demonstrado por Kloiber (1953), Wells (1960), Schäefer (1961), Gejval (1963) e Spence (1967), conforme citado por Wahl e Henke10.

Portanto, em comparação com o estudos históricos mais importantes que tratam da determinação do sexo dos crânios, o presente estudo mostra resultados aprimorados importantes. Esses resultados são baseados em técnicas antroposcópicas e antropométricas e abrem caminhos para novos estudos baseados em estatísticas, que podem ser de grande auxílio para investigações médico-legais.

O equipamento necessário para a execução desta técnica é prontamente disponível para a maioria dos consultórios médicos legistas.Qualquer modelo de dispositivo de fotocópia pode ser usado.

Esta técnica é fácil de executar, oferece resultados rápidos e dispensa qualquer tipo de treinamento especial para o médico legista.

A técnica para a sexagem de crânios apresentados neste estudo oferece uma alternativa prática a outros métodos. Esta técnica vai ao encontro das necessidades e realidades da investigação forense no nosso país hoje.

AGRADECIMENTOS

Ao Doutor Wilmes Gonçalves Teixeira, Professor de Medicina Legal da Universidade de Braz Cubas, pela sugestão o sujeito deste estudo e ao Professor Günter Wilhelm Uhlmann, do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade de Guarulhos, pelo auxílio na tradução de textos em língua alemã, essenciais para este estudo.

1. ALVES ES – Medicina legal e deontologia. Curitiba, Ed. do Autor, 1965.

2. ARBENZ GO – Medicina legal e antropologia forense. Rio de Janeiro, Atheneu, 1988.

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5. UBELAKER DH – Restos de esqueletos humanos. Chicago, Aldine, 1978.

6. STEWAR TD – Essentials of forensic anthropology. Springfield, Thomas, 1979.

7. RATHBUM TA, BUIKSTRA JE – Identificação humana. Springfield, Thomas, 1984.

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9. HOSHI H – Diferença de sexo na forma do processo mastóide em norma occipitalis e sua importância na determinação do sexo do crânio humano. Okajima “s Folia Anat Jpn 1962; 38: 309-17.

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16. SCHULTZ AH – Anthropologische untersuchungen na der schädelbasis. Arch Anthrop 1917; 17: 1-103 apud HELMUTH H, 1968. p. 75.

17. SCHAEFER U – Greuzen und möglichkeiten der anthropologischen untersuchung von leichenbränden. In: Bericht über den Internat Kongr f Vor und Frühgeschichte, 5., Hamburgo 1958 apud HELMUTH H, 1968. p. 76.

18. KEEN JA – Um estudo das diferenças entre os crânios masculino e feminino. Am Phys Anthropol 1950; 8: 65-79.

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